segunda-feira, agosto 17, 2009

Esmola

Vagam pelas noites vazias. À companhia, piolhos e o ronco da barriga. Pés imundos, casco duro, acostumados a porrada, escarro e descaso. Ao andar cambaleante e decidido, precede o anúncio da brisa, que revela a putrefação do corpo e a degradação do ego.
São loucos que dormem enquanto trabalhamos, largados na calçada. O cobertor de papelão anuncia nossos sonhos de consumo, a nova televisão esconde o que não queremos ver. As feridas expostas, os cancros, as secreções ferem nossos sentidos, nossa moral, nossa razão. É dificil crer que exista alma debaixo de tanto asco. E passamos por eles, cerrando os olhos, os narizes e o coração, fingindo serem apenas assombrações. Mas não são.
A mesma matéria, a mesma centelha. E eis que são espelhos retorcidos. E o que nos mostram, a não ser quem somos?
E nessa estrada infindável, vejo, com esperança, que estão à minha frente, marcando o caminho com seu sangue impuro, deixando-o como esmola. Eles que estão tão perto, que já abandonaram-se ao destino, será que podem dar alguma notícia quando chegarem lá?

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